O Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa afirmou que, face à suposta falta de produtividade dos trabalhadores mais idosos, "seria necessário pensar (...) em encontrar formas adequadas de "pré-pensionamento" destes trabalhadores que, por razões ligadas à sua formação, à sua longa história de trabalho e até por razões ligadas à própria inadequação às novas condições [de trabalho], hoje frequentam sobretudo centros de saúde para obter licenças médicas e outros mecanismos de ausência temporária".
Assim, para o Governador do Banco de Portugal os trabalhadores, a partir de uma idade que não esclarece (mas que será relativamente baixa já que se está a referir a pré-pensões), devem ser excluídos da população activa, passando a ser pessoas "descartáveis" da sociedade. Serão os novos "excluídos sociais", num contexto em que a população envelhece, o que igualmente significa o envelhecimento da população em idade activa.
O que se contesta não é a possibilidade de recurso a reformas antecipadas ou a pré-reformas mas a argumentação usada. A possibilidade de recorrer a estes instrumentos existe há muito. Infelizmente há pessoas que por razões de saúde não podem continuar a prestar actividade económica, embora haja progressos na medicina que podem tornar reversíveis as condições de saúde – e, por isso mesmo, o regime de reformas antecipadas permite a reversibilidade destas. Um Governo que, recorde-se, tem usado o argumento do aumento da esperança de vida para aumentar a idade da reforma para os 66 anos e proceder a cortes nas pensões.
O que arrepia é a fundamentação económica usada para mascarar estereótipos e cavar divisões sociais, na linha do que faz o Governo, entre os reformados e os activos. Nesta linha o Governador invoca a falta de produtividade, a inadaptação a condições de trabalho e deterioração das condições de saúde para admitir a exclusão da população activa destes trabalhadores. Este fundamentalismo económico e esta perspectiva desumanizante, estigmatizante e guetizadora vai contra o que defendem hoje organizações internacionais como a Organização Mundial da Saúde, a Organização Internacional do Trabalho e a Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho. Estas organizações têm defendido abordagens, políticas e medidas que vão no sentido da adaptação das condições de trabalho ao longo do ciclo de vida, para a valorização da experiência dos trabalhadores mais velhos e para a transmissão de saberes entre as várias gerações de trabalhadores.
Estas organizações combatem igualmente os estereotípicos que cavam discriminações entre cidadãos com diferentes grupos de idade e incentivam o conflito de gerações. Por exemplo, a Organização Mundial da Saúde tem tido um papel relevante no esclarecimento e na denúncia de estereótipos ligados à saúde na sua relação com a idade.
A gravidade de afirmações deste tipo reside não apenas no seu conteúdo mas também no facto de provirem de uma pessoa que está à frente de uma instituição como o Banco de Portugal, de quem à partida se deveria esperar uma atitude defensora da integração das pessoas na sociedade, onde é profundamente relevante a integração no mercado de trabalho, já que é na inserção produtiva que se geram rendimentos de que as pessoas vivem. Sobretudo num contexto de envelhecimento da população, o que significa também o envelhecimento da população activa.
O Governador não pode, além disso, esquecer que excluir ainda mais pessoas do emprego é tornar as suas condições de vida mais vulneráveis a políticas que, como bem sabe, vão no sentido do empobrecimento e do corte das pensões. Certamente que também conhecerá a atitude inqualificável do Governo que determinou a suspensão do pagamento dos complementos de pensões nas empresas do Sector Empresarial do Estado com uma redução significativa dos rendimentos destes trabalhadores. Relembra-se que estes trabalhadores foram coagidos a deixar as empresas invocando-se as necessidades destas. Mais do que sugerir aos outros a passagem à reforma, talvez fosse melhor o Sr. Governador pensar na sua própria passagem à aposentação para não repetir, em nome do Banco de Portugal, declarações que atentam contra a dignidade dos trabalhadores mais idosos.
A CGTP-IN sempre defendeu que os trabalhadores com longas carreiras contributivas (40 ou mais anos) possam aceder à reforma, independentemente da idade, sem qualquer penalização. Para além desta medida, a CGTP-IN defende ainda uma política de trabalho que adapte o trabalho ao longo do ciclo de vida das pessoas e que nomeadamente considere: a melhoria e a adaptação segundo a idade das condições de trabalho, a formação contínua nos locais de trabalho, a saúde e a segurança no trabalho, a transmissão de conhecimentos entre trabalhadores de várias gerações, a reparação dos acidentes de trabalho e doenças profissionais, a reposição da idade legal da reforma aos 65 anos, a revogação do factor de sustentabilidade e a valorização no cálculo das reformas das longas carreiras contributivas.
DIF/CGTP-IN
Lisboa, 24.09.2014