Declaração Sobre o PEC

 Extractos fundamentais da declaração de Manuel Carvalho da Silva, Secretário-geral da CGTP-IN, proferida no final da reunião de Concertação Social onde o governo apresentou o Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Independentemente de uma análise mais detalhada e aprofundada e de um pronunciamento mais completo sobre o Programa de Estabilidade e Crescimento, há a relevar 3 questões face ao que foi exposto pelo PM e que é do conhecimento público.


1.º - Este Programa de Estabilidade e Crescimento pode caracterizar-se como um programa de prosseguimento e possível aprofundamento da crise. Ele não traz respostas objectivas ao que constitui a primeira preocupação do que podemos chamar crise, que é o desemprego.

É bom lembrar que a crise não é o problema da especulação das acções na bolsa todos os dias; a crise é o desemprego, a precariedade, a falta de qualidade no emprego, a pobreza, as desigualdades, as injustiças que marcam a sociedade portuguesa. Isso é que é a crise. E, portanto, este programa não traz respostas objectivas no plano do emprego. Sobre isso não diz nada, e, não se centra, não está voltado para o desafio prioritário que deve ser o garantir de mecanismos de crescimento económico e de desenvolvimento da sociedade colocando a prioridade nas pessoas. Antes pelo contrário. Há neste programa de estabilidade e crescimento claros indicadores de uma submissão às chantagens das instâncias do poder financeiro internacional e nacional que dominam e se impõem sobre as políticas nos diversos países.

2.º aspecto que caracteriza o Programa de Estabilidade e Crescimento – Depois de ouvirmos a exposição do PM e do Ministro das Finanças, ele consubstancia caminhos de uma perigosa fragilização das políticas sociais e desvalorização dos salários dos trabalhadores, desde logo dos trabalhadores da administração pública. Mas, como nós sabemos, quando os salários da administração pública são desvalorizados, são todos os salários que são desvalorizados.

Diremos que, em relação às políticas sociais, por aquilo que foi afirmado, no que se refere à perspectiva de redução real do valor das pensões, porque uma manutenção dos valores, mesmo num contexto de uma inflação que possa não crescer muito, significa sempre quebra das pensões. Por aquilo que foi anunciado de congelamento das pensões, de pretensões de aceleração de equiparação das condições de reforma da administração pública ao do sector privado, de alterações no subsídio de desemprego e as formulações usadas pelo PM no que diz respeito a essa matéria, tudo isto perspectiva uma fragilização das políticas sociais. Isto é extremamente grave, porque, em Portugal, esta fragilização pode significar um agravamento acelerado da pobreza.

E, tudo isto, aparece apresentado num cenário, numa contextualização que é: colocar os portugueses numa campanha de justicialismo entre aqueles que usufruem das migalhas para esconder o agravamento das desigualdades.

E, por exemplo, enquanto se apontam coisas muito concretas para o congelamento das pensões, para a redução de condições no subsídio de desemprego e congelamento de salários, nada, ou muito pouco, se diz sobre matérias que são fundamentais como é o caso do combate à fraude e à evasão fiscais. Não há uma referência a esta matéria. Não há uma referência ao combate à economia clandestina. Não há uma referência à necessidade de cortar vantagens fiscais indevidas usadas por alguns sectores empresariais, quer da indústria, quer do financeiro. Não há uma afirmação forte para que toda a riqueza contribua para o orçamento de estado. Antes pelo contrário, cria-se a ideia de que não há agravamento dos impostos para não haver penalização sobre os portugueses, mas o facto é que actualmente há muita riqueza que não paga impostos e, não devendo haver agravamento de impostos para quem paga, contudo, impunha-se que a riqueza que não contribui para o orçamento de estado contribuísse. Portanto, aqui se reforça o que disse: o segundo traço deste programa é uma perigosa fragilização das políticas sociais e desvalorização dos salários porque se afirma claramente o caminho dos congelamentos dos salários.

3.º aspecto fundamental deste programa – É anunciado um enorme pacote de privatizações, quantificado no imediato em 6 mil milhões de euros, e como é evidente, debaixo da chantagem do sector financeiro internacional, desde logo com as agências de rating à cabeça, mas também nacional. Perante a necessidade do país, do estado fazer dinheiro para reduzir a dívida pública, estas privatizações surgem como num mercado de saldo. E isto potencia, claramente, ou pré-indicia, até, que os detentores da riqueza, os grandes capitalistas deste país devem estar com um sorriso de orelha a orelha, porque têm aqui uma possibilidade de comprar barato o que vale muito. E isto é um problema imediato, mas é também um problema a prazo, porque um país que tem um Estado desarmado em áreas fundamentais da economia como aquelas que se pretende privatizar, torna-se um país muito menos capaz de impulsionar o seu desenvolvimento.

3 comentários finais:

- Há no Programa de Estabilidade e Crescimento aspectos pontuais de sinal positivo, como a taxação de mais-valias e outros aspectos pontuais, que aliás constituíam reivindicações da CGTP, mas esse não é o traço dominante do programa.

- O segundo comentário é para dizer que, perante o cenário que nos foi presente, mais se justificam as propostas que a CGTP fez no seu documento que apresentou ao governo e que divulgou publicamente na 6.ª feira passada. É preciso introduzir na sociedade portuguesa um debate muito profundo sobre a re-industrialização; o que fazer do ponto de vista estratégico em cada sector de actividade no nosso país; colocar os patrões e os sindicatos a discutirem e a assumirem compromissos; como impulsionar a actividade económica. Isto é que constituiria uma base muito importante para dar a resposta aos problemas do país.

- E um terceiro e último comentário – a CGTP reafirma que nós temos capacidades, o país precisa de uma resposta rápida a esta situação e o povo português tem capacidades para o fazer, mas é preciso um clima de responsabilização, de confiança, de participação, de mobilização e motivação das pessoas, com compromissos sérios e não apenas com esta pretensão do governo de mobilizar para as políticas pré-definidas debaixo de uma sujeição às imposições da chantagem do sector financeiro e especulativo.

Os trabalhadores têm que se mobilizar e lutar pelas suas propostas e o povo português tem de reagir a este Programa de Estabilidade e Crescimento sob pena de condicionar o desenvolvimento do país.