96ª Conferencia Internacional do Trabalho - OIt 2007

lanca125O Trabalho Digno para o desenvolvimento sustentável e a situação portuguesa
Intervenção de Florival Lança
Delegado dos Trabalhadores/Portugal

 


Intervenção de Florival Lança
Delegado dos Trabalhadores/Portugal



O Trabalho Digno para o desenvolvimento sustentável
e a situação portuguesa

 

 

Senhor Presidente,

lanca1Gostaria de começar por salientar a importância do Relatório do Director-Geral da OIT a esta Conferência. Foram abordados problemas fundamentais com que a humanidade se defronta como o desenvolvimento sustentável, as crescentes desigualdades, a globalização económica e os direitos dos trabalhadores. Salientarei alguns destes problemas, sem, porém, deixar de ter presente a experiência do meu país. Porque como bem explica o relatório da OIT para uma globalização justa, a governação da globalização deve começar a nível local.

Um aspecto fundamental abordado é o das desigualdades. Processos em curso – como a globalização económica, o impacto das novas tecnologias de informação e de comunicação, a reconfiguração do Estado e dos serviços públicos, as privatizações, o poder do capital financeiro, as reformas dos sistemas de protecção social – estão a ter um impacto, que tem sido subestimado, no aumento das desigualdades. Se estes processos não forem ponderados e não houver uma adequada regulação, nacional e internacional, dificilmente serão as políticas sociais que poderão dar resposta.

As políticas de inclusão social e de igualdade, por melhor intencionadas que sejam, serão impotentes para contrariar tendências de sinal adverso, resultantes de uma competitividade desenfreada e da perda dos valores da solidariedade.

A reforma da segurança social ilustra este caminho de desigualdades crescentes. O que hoje está a acontecer um pouco por todos os países desenvolvidos é a emergência, em nome das finanças públicas e da competição económica, de sistemas em que a responsabilização pela cobertura dos riscos sociais cabe cada vez mais ao indivíduo e cada vez menos à colectividade organizada em Estados.

lanca2Em Portugal a reforma que acaba de entrar em vigor tem como intenções essenciais a redução da taxa de substituição dos salários na determinação das pensões e a promoção de esquemas privados que todos sabemos têm características pouco ou não redistributivas e a que têm pouco acesso os trabalhadores de mais baixos rendimentos.  

A regulação do mercado de trabalho é outro tema crítico. É preciso criar não só mais mas melhores empregos. A competitividade depende hoje sobretudo de uma mão-de-obra qualificada. Existe a percepção do Governo e dos actores sociais de que assim é, o que representa, por si só, um progresso. E existem programas e medidas com vista a aumentar a qualificação e a formação profissional.

Porém, não há a mesma preocupação quanto aos empregos precários, ao falso trabalho independente e ao trabalho não declarado. Na situação portuguesa, um em cada cinco assalariados não tem um vínculo estável de trabalho apesar de ocuparem postos de trabalho que são quase sempre de natureza permanente. 

Os jovens são particularmente abrangidos, estando-se a cavar um fosso entre as suas condições de trabalho e a dos trabalhadores mais velhos. É também chocante que não se actue firmemente face ao falso trabalho independente, apesar da recomendação aqui aprovada, no ano passado, sobre a relação de emprego. 

Senhor Presidente,

O Trabalho Digno é um dos componentes essenciais de uma Agenda para uma globalização justa.

Temos um elevado capital constituído por 7500 ratificações de convenções. Aprovámos em 1998 uma Declaração relativa aos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho que contém uma base universal de direitos básicos compreendendo a liberdade sindical e o direito de contratação colectiva, a abolição do trabalho forçado e do trabalho infantil, a não discriminação no emprego e na profissão. Mais de 50 empresas multinacionais subscreveram acordos com organizações sindicais que se desenvolveram sobretudo depois do ano 2000 e se inspiram nas normas da OIT.  

Justificam-se porém duas observacoes:

lanca3A primeira respeita ao direito de contratação colectiva que constitui, com toda a justiça, uma peça essencial da Agenda do Trabalho Digno. Se há progressos também há recuos já que o mercado de trabalho está mais desregulamentado e tem recuado a cobertura contratual. Mas não só.

Há situações perfeitamente inaceitáveis como acontece em Portugal, em que o Código de Trabalho prevê a cessação das convenções colectivas. Na legislação portuguesa se um empregador ou associação patronal quiser fazer cessar um CCTV basta-lhe simplesmente não negociar e recusar todas as formas de resolução do conflito, incluindo a arbitragem.

 

E o Ministério do Trabalho determinou já a cessação de convenções colectivas de trabalho. Para nós isto representa uma violação grave dos princípios constituintes da OIT, incluindo as convenções sobre os direitos de organização e de contratação colectiva e a Declaração de 1998.   

A segunda respeita às empresas multinacionais, aos códigos de conduta, incluindo a Declaração da OIT, e à responsabilidade social da empresa. Hoje o que se está a passar, incluindo na realidade portuguesa, é o crescente número de processos de reestruturação e de deslocalizações, que não têm em conta os princípios estabelecidos nestes instrumentos de regulação internacional.

Senhor Presidente,

O sistema das Nações Unidas é hoje ainda mais importante numa época de rápidas mudanças e da intensificação da globalização económica. O papel da OIT é crucial para assegurar uma globalização justa. Daí a nossa identificação com o discurso do Director-Geral.